sexta-feira, 24 de agosto de 2007

O homem e seu quintal


"O homem e seu quintal" é um dos livros que sempre consulto! Já falei do Zaé, no tópico sobre as trovas em Outdoors, mas não posso "blogar" sem falar desse livro, que, por exemplo, nas "orelhas", traz as palavras de Vinícius de Moraes, Renato Castelo Branco, Anselmo Duarte e Lauro César Muniz, amigos do autor. Fico feliz por isso, mesmo porque, se um dia fizerem uma "lista dos amigos do Zaé", meu nome e de outros trovadores estarão lá, ao lado desses figurões aí. Quero falar de uma curiosidade sobre essa obra: foi lançado, antes do lançamento, em um capítulo de novela! A novela era "Salvador da Pátria", aquela do Sassá Mutema (Lima Duarte). Uma personagem, no início do capítulo está "lendo" o livro (só a capa, na verdade, porque o livro ainda não estava pronto) e declama um dos poemas para outra personagem. Que show! Conto esse episódio só para instigar os amigos que escrevem a sempre buscarem formas alternativas de divulgação, ou mesmo de escrita. Afinal, o papel é branco e tudo ainda está por fazer, não é mesmo? Parabéns, sempre, Zaé! E viva a tonga da mironga!
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O TÁXI


Chofer, me leve para a rua do meu encontro
onde alguém não sabe que me espera
e um sorriso amanhece todas as manhãs
e se gasta antes do meio-dia
porque eu ainda não cheguei.

Não é que me julgue o único capaz
de perpetuar o sorriso
mas é que vou levando comigo
algumas palavras e algumas entregas
e tenho pressa de chegar antes da tarde
antes que outro transeunte sem caminho
ache o endereço antes de mim.

Mas não corra tanto
que possa assustar as crianças
nem espante os pássaros dos fios
que é através deles que enxergo o céu.
Se algum poeta atravessar a rua
breque, não ofenda seus passos
que também eles não levam a lugares
onde eu já não tenha me hospedado
ou escondido uma esperança
ou amanhecido sozinho
com o mesmo frio com que cheguei.

Mas, se for possível, corra
deforme as árvores, as casas, as pessoas
que já cansei de decorá-las
sem que se dessem por mim.

No farol, ali em frente, entre à esquerda
porque ao longo há um gato pardo
esperando ser atropelado ainda hoje.
O senhor sabe, se nós o atropelarmos
irá conosco o som do seu último gemido
e é possível que quem não me espera se espante
e feche a janela quando chegarmos.

Chofer, sei que talvez a corrida seja longa
e o trânsito seja difícil
mas eu prometo pagar-lhe trocado
e com boa gorjeta de bênçãos
porque no momento em que chegarmos
eu o farei herdeiro de todas as minhas coisas
terrenos, praias, horizontes
portões, relógios, letras de samba
que o senhor se sentirá tão rico
que já poderá se livrar da direção dos outros
e procurar como eu o seu caminho.

Chofer, chofer...
pare naquela esquina.
Tenho a impressão de que já passei por aqui.
Olhe, talvez aquela moça de braços abertos
saiba onde fica o lugar do meu encontro.
Zaé Júnior

Muito além da arte de "trovar"


Chamamos de trovadores aos poetas que fazem trovas, correto? Quase. Explico: essa Antologia reuniu diversos sonetistas/trovadores, ou, se você achar melhor, trovadores/sonetistas. Um, porém, não fazia nem trovas, nem sonetos com regularidade. Aliás, não sei se ele chegou a fazer algum soneto... Trova, uma ou outra! Músicas, fez diversas (e como são lindas), era um chorão! Fazia chorinhos lindos com suas mãos e mente hábeis! Pirogravurista, Artísta Plástico, etc. etc. etc. Um dos maiores trovadores que São Paulo teve a honra de acolher chamava-se MÁRIO BELTRAME. Sempre presente às reuniões mensais, acompanhando sua esposa, a Presidente da Seção, Domitila Borges Beltrame e... fazendo capas dos livretos de trovas! Como esse que ilustra o "Post". Saudades, Mário!

Coletânea Rio Grande Trovador


Agora já é tradição... Aliás, tradição é o sobrenome da União Brasileira de Trovadores Seção Porto Alegre. Esse livro aí, por exemplo, é editado em conjunto com a realização dos jogos florais, que vêm ocorrendo há mais de 30 anos na cidade. Essa edição foi organizada por Marisa Vieira Olivaes, destacada trovadora gaúcha. Para integrar a coletânea, foram convidados 9 trovadores de outros recantos do país (e eu pude, honrado, representar São Paulo). De Marisa destaco a seguinte trova, que integrou a coletânea IV:
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-o-o-o-o-
Magia é o instante - perfeito -
em que nós dois somos um,
quando, entre o seu e o meu peito,
não sobra espaço... nenhum!

Flávio Roberto Stefani


"ABCenário Gaúcho - poesias gauchescas", é um livro feito com alma. Com a essência de uma terra sempre pronta a representar nossa gente, de fronte erguida. Sobre o trovador Flávio Roberto Stefani falarei em outra oportunidade, hoje vou, apenas, deixar um poema dessa obra de conteúdo e forma delatores de uma cultura, que é preservada por nossos irmãos do Rio Grande, como quem defende a família e a sua honra. "Brasil" dito por eles, tem um significado muito mais amplo...
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Uma lenda

Era uma vez um homem
que virou gaúcho
que virou estátua
e hoje é uma lenda!

O homem, de carne e osso,
nasceu como todos,
meteu o pé no barro,
piscou pras meninas,
fez estrepolias,
casou, foi feliz.

O gaúcho foi forjado na lida,
no campo, em mangueiras,
na geada fria
das manhãs do Sul,
e saiu aos quatro ventos,
rasgando poentes
a dizer aos mundos
das belezas da tradição gaúcha.

A estátua brotou de mãos e mente afinadas
de outro gaúcho
artista puro
que a colocou nas portas da cidade,
como que a defendê-la
pela força do bronze
e a expressão do olhar.

A lenda é o próprio Paixão Cortes,
símbolo vivo desta terra,
homem, gaúcho e estátua,
que orgulha qualquer taura
que pisa neste chão!
Flávio Roberto Stefani