domingo, 21 de agosto de 2011

Versos Fraternos


Os trovadores, assim como os membros de fraternidades, costumam tratar-se por IRMÃOS. Em suas correspondências, nas referências que fazem a trovadores distantes, ou, mesmo, já falecidos, o nome do trovador é sempre precedido da palavra IRMÃO... Tenho a honra de pertencer à União Brasileira de Trovadores e pude notar que esse tratamento fraterno é, apenas, reflexo de uma condição não escrita, inerente à todos os trovadores que conheci. Não é à toa que produzem, os trovadores, poetas especiais, pérolas do pensamento humano, que são disseminadas em cada livreto editado à ferro e fogo, por esse Brasil, há tantos anos. Tenho o costume de visitar os trovadores que conheço e, apesar de, ultimamente, estar em débito com algumas visitas, pude perceber que os trovadores, em geral, são profissionais destacados, nos mais diversos ramos do conhecimento. Alguns de cultura invejável, pós-graduados, catedráticos; outros verdadeiros mestres nos ofícios mais diversos, como gráficos, técnicos, donas de casa exemplares, aposentados, professores em todos os níveis, vendedores, funcionários públicos, autônomos. Todos, sem exceção, tem um plus... Talvez, este plus, os tenha tornado, em algum ponto da vida, pessoas especiais, com algo a dizer... TROVADORES, com todas as letras maiúsculas! A todos eles, aos quais, com orgulho, chamo de IRMÃOS, dedico suas próprias trovas, mesmo aquelas que não fiz incluir neste texto.

E, afinal de contas, não somos, mesmo, todos os Homens, Irmãos ? Vejamos... Arlindo Tadeu Hagen, trovador radicado em Juiz de Fora/MG, em seus versos, nos mostra que existem laços fraternos muito mais fortes do que o próprio sangue:

Existe tanta união
entre teus sonhos e os meus,
que só não és meu irmão
por um descuido de Deus!

explicando, em seguida:

Nesta união que não morre,
somos irmãos de verdade,
pois em nossas veias corre
o sangue azul da amizade!

Fernando Costa, de São Paulo, consegue unir o sangue e a amizade, quando diz :

Sou feliz porque consigo,
num mundo em desunião,
ter um irmão como amigo
e um amigo como irmão...

Mas o irmão de verdade é apenas aquele amigo de todas as horas, ou aquele ao qual estamos ligados por laços sanguíneos ? Ana Maria Motta, de Nova Friburgo, chama a nossa atenção para um outro tipo de fraternidade, talvez, até, mais valiosa :

Quando um irmão nos acode,
ou quer, de fato, ajudar,
jamais indaga se pode;
ajuda sem perguntar.

E as fraternidades não são, justamente, baseadas nessa ajuda desinteressada e sempre presente? Atentem, meus Irmãos, para o que dizia Elton Carvalho, trovador do Rio de Janeiro, num interessante jogo de palavras, onde, o que é muito difícil de conseguir, em termos de trova, a palavra/tema IRMÃO aparece grafada em todos os versos e por duas vezes no último...

Socorre, irmão, no caminho,
teu irmão que nada tem...
não existe irmão sozinho:
todo irmão é irmão de alguém!

E quando isto acontece, quando esta importante ajuda é por nós recebida, venha ela de onde vier, façamos como José Maria Machado de Araújo, que disse:

Quando ao céu levanto as mãos,
vejo o quanto sou mesquinho,
pois tenho milhões de irmãos
e penso que estou sozinho!

e arremata seu pensamento, nos versos seguintes, explicando, a seu modo de ver, quem são os irmãos de verdade:

Em qualquer canto da vida,
irmão é aquela pessoa
que pela gente é ferida
e, ferida, nos perdoa!

Que laços seriam esses, então, a unir as pessoas, tornando-as irmãos ? Aprendi a chamar todos os trovadores do mundo de irmãos... Por quê??? Cícero Rocha põe mais lenha na “fogueira das indagações”:

Iludem laços visíveis...
os laços de sangue enganam...
sem liames invisíveis,
nem irmãos gêmeos se irmanam.

E Augusto Astério de Campos, numa trova digna de moldura, descreve a fraternidade universal, sem rótulos, com beleza poética e sensibilidade inigualáveis:

Irmão é o que traz de ofertas
de paz, quando estende a mão,
cinco pétalas, abertas,
das flores do coração!...

Sublime, mesmo, é quando se reúnem, em duas pessoas todos os laços invisíveis, visíveis, sanguíneos e de amizade, como na trova magnífica de Jorge Murad:

Vendo um guri carregado,
por um outro, o ancião,
perguntou: - Não é pesado?
- Não, senhor, é meu irmão!

Ser IRMÃO, de verdade, com todas as letras maiúsculas, não é tarefa fácil, a trova de Maria Nascimento Santos Carvalho, é quase uma prece-parábola, um pedido de perseverança:

Que eu faça o bem no caminho,
amparando meu irmão,
nessa glória de moinho
que ajuda o trigo a ser pão!

A trova seguinte, de autoria do já mencionado trovador e engenheiro Arlindo Tadeu Hagen, bem que poderia ter sido feita por um filósofo renomado:

Não desprezes teu irmão,
porque é simples, porque luta.
A mais nobre construção
não dispensa a pedra bruta!

O desprezo lembrado acima é um forte empecilho à verdadeira Fraternidade, como também o é a Ambição. Ouçamos as palavras sábias de José Maria Machado de Araújo, um dos pioneiros do movimento trovadoresco moderno, nascido em Portugal e que, radicado no Brasil por mais de 60 anos, hoje faz trovas no infinito...

Nascemos irmãos comuns...
mas a ambição e os engodos
puseram, nas mãos de alguns,
o mundo que era de todos!...

E esta afirmação, encontra guarida no lamento de David de Araújo, de São Paulo:

Haveria mais ternura
nesta existência que passa,
se os que se dão na ventura
fossem irmãos na desgraça!

Orlando Brito explica como devemos fazer para evitar tais desencontros, chamando nossa atenção para a importância do encontro das mãos...

Mãos que imploram, na pobreza;
Mãos que assistem seus irmãos;
quanto amor, quanta beleza
há no encontro dessas mãos!

Para mim, é muito importante poder chamá-los, a todos, de IRMÃOS... Eu, que, por força dos desígnios superiores, não pude conviver com meus três IRMÃOS carnais, hoje em outro plano espiritual... Plano este onde, hoje, fazem versos muitos dos trovadores acima mencionados mas que nos versos deixados, nas sábias palavras com que nos presentearam, e como diria o poeta, “quem deixa versos, parece que morre menos...” ainda estão vivos entre nós! De minha parte, repito a trova com a qual iniciei esta Peça, do atuante Arlindo, vice-presidente da UBT Nacional, como um agradecimento a todos vocês, materialmente presentes, ou não:

Existe tanta união
entre teus sonhos e os meus,
que só não és meu irmão
por um descuido de Deus!