segunda-feira, 25 de novembro de 2013

International Youth Service (IYS), o valor da amizade e as mãos de Teresa.

 
 
 
 
Em 1983 conheci, por intermédio de um colega estagiário da Caixa Econômica Federal (Júlio), uma Instituição finlandesa chamada International Youth Service, que promovia a correspondência entre jovens de mais de 100 países diferentes, entre eles o Brasil. Era simples: você preenchia um formulário, no qual respondia várias perguntas sobre interesses, grau de conhecimento de línguas estrangeiras, gostos e dados pessoais. A partir daí, após receber o formulário preenchido, o instituto cruzava os dados recebidos em seus computadores e elaborava uma lista de jovens de diversos países, com interesses comuns, com os quais você poderia trocar correspondência. Recebi nomes de pessoas da Itália, do Chile, da Inglaterra e de Portugal.
 
O instituto foi criado em 1952, em Turku, na Finlândia e foi extinto em 30 de Junho de 2008, posto que não podia fazer frente ao desenvolvimento da internet, das redes sociais e das facilidades do correio eletrônico.
 
As pessoas, em geral, atualmente, não escrevem cartas. As únicas cartas que costumam chegar às nossas caixas de correspondência, invariavelmente, são boletos bancários, avisos de eventuais faltas de pagamento dos boletos bancários, senhas, cartões de crédito, encomendas, cartões de natal de políticos, cartões de felicitações... de políticos, cardápios de pizzarias, churrascarias e lanchonetes, ou seja, cartas, mesmo, como se fazia até os anos 90 (e olhe lá!), são espécies em extinção.
 
Pois bem, como eu disse acima, recebi uma pequena lista de pessoas, para as quais pude enviar cartas e das quais recebi algumas, também.
 
Apenas uma dessas correspondências vingou: a que mantive por cinco anos, aproximadamente (entre 83 e 88),  com uma jovem portuguesa chamada Teresa. Neste período o Brasil caminhava para a democratização e progredia, a passos lentos, economicamente falando, embora permaneça carente em diversas áreas, ainda.
 
Portugal, por sua vez, entrava de vez para a Comunidade Econômica Europeia, ou, como escreveu  certa vez Teresa, a CEE é que talvez entrava em Portugal... Teresa intuiu, em seus relatos, diversos problemas que afetariam seu país no futuro, presente hoje.
 
Eu compartilhava com ela o início das Bandas Nacionais, como Legião Urbana, Titãs, Ira! e outras mais e ela me mandava folhetos contando sobre "Os Heróis do Mar".
 
Muitas cartas foram extraviadas nestes anos, e eu não sabia se por conta de minha atividade estudantil, voltada aos movimentos populares, ou pela ineficiência dos correios. O fato é que a correspondência parou.
 
Enfim, foram anos de mudanças importantes em nossos países e em nossas vidas. Devo a ela, sem sombra de dúvida, o desenvolvimento e a fluidez de minha escrita. Sempre que escrevo, hoje, estabeleço a figura do leitor, do interlocutor interessado e cúmplice. Sei que haverá, do outro lado da escrita, alguém que não é passivo, que vivencia meus relatos, concordando ou discordando, mas sempre acrescentando suas próprias experiências ao meu texto. A existência do texto pressupõe respeito entre os interlocutores, sejam eles identificáveis, ou não.
 
A parte tudo isto e muito mais, das experiências e anseios que compartilhamos, da correspondência nasceu uma grande amizade, daquelas amizades eternas da infância e adolescência, que levamos por toda a vida, estejamos perto ou distantes.
 
Todas as cartas foram guardadas. A amizade também. Intacta.
 
Porém, assim como a internet acabou com o IYS, ela também poderia trazer novamente as palavras que foram caladas por 25 anos...
 
Procurei muito, sem sucesso. A Leila também. E foi dela a iniciativa que selou o final da procura: "Sérgio, mandei mensagens para várias Teresas no Facebook, todas de Portugal e com o mesmo sobrenome dela... vou mostrar as fotos para você!"
 
Eu olhei as fotos e não reconheci nenhuma delas. Frustante. Embora uma, em especial, tenha adicionado a Leila. Ora, veja!
 
Era véspera de feriado e a Leila deu outra sugestão: pegar as cartas guardadas para, quem sabe, encontrar alguma pista que nos levasse a encontrá-la.
 
Naquele dia, lendo todas elas, fui dormir por volta de 04:00h da manhã, mas havia uma pista: uma amiga, de nome Cristina, que frequentou a mesma escola que ela e que cantava o Fado! É que, em uma das cartas, Teresa havia descrito a amiga: morena, alta e de olhos verdes.
 
Nova pesquisa na internet, até que, no Youtube, um vídeo de uma cantora chamada Cristina me deu praticamente a certeza de haver encontrado a amiga de Teresa, Cristina Santos...
 
 
 
Pois bem, amigos, pesquisa vai, pesquisa vem, consegui um contato com Cristina, que, imediatamente, respondeu ser, sim, a amiga dos tempos de escola. Infelizmente, ela havia perdido contato com Teresa, mas tinha contato com outras amigas comuns e tentaria me ajudar.
 
No dia seguinte, toda feliz, Cristina me disse que havia falado por telefone com Teresa e, finalmente, pudemos restabelecer o contato interrompido, por vídeo chamada (Skype), num momento de muita emoção e alegria, em que falamos (eu e minha esposa Sherlock Leila) e conhecemos os novos membros das famílias, nossos filhos. 
 
Sempre considerei a amizade um dos maiores valores que a vida nos proporciona, agora mais ainda. Numa das fotos que tenho de Teresa, as colegas de escola a fotografaram no momento em que escrevia uma carta, não sei se para mim, ou para sua família, que se encontrava distante, mas acho que esta foto, aliás, um pequeno detalhe dela, sintetiza toda esta postagem e com ela termino esta crônica-homenagem...
 
 

segunda-feira, 11 de novembro de 2013

POEMA AUTOEXPLICATIVO

 
 
 
Poema[1] Autoexplicativo[2][3][4][5][6][7][8][9]

 


  

Sérgio Ferreira da Silva[11]





[1] Poema, sim: sou poeta!
[2] Autoexplicativo, sem hífen, dado que o prefixo termina em vogal diferente da vogal inicial do segundo elemento­.
[3] Você, leitor não precisará “entender o poema”... O poeta não é um ser supremo, senhor das emoções e das palavras. Não é senhor nem do poema: poema publicado, poema perdido! Interprete da maneira que quiser, ou que não quiser. Ele é seu! E é autoexplicativo.
[4] Não é preciso buscar referências externas, intertextualidades, alteridades... Busque em você mesmo aquilo que o poema lhe disser!
[5] Há uma possibilidade muitíssimo remota do “Poema Autoexplicativo”, no futuro, cair nas mãos de um (a) estudioso (a), de um (a) crítico (a) literário (a), ou de um blogueiro (a) com vocação para ambos. Não acredite no que ele/ela disser, por favor! Não que eu não admire o trabalho deles: o problema é que, ao dissecar um poema, há uma tendência natural de situá-lo no tempo, no espaço, na biografia do autor, em sua própria obra, ou em fatos e movimentos culturais em voga... Aí, um poema de 4, 6, 12, ou mais linhas rende 30 páginas de referências, reflexões, teses, críticas, para, por fim, cair na prova! E eu não quero uma legião de vestibulandos me odiando!
[6] Fruto de tantas análises, alguém um dia poderá dizer (então, digo eu): “Ah, o Poema Autoexplicativo é aquele poema que não diz nada!” É por aí, mesmo: não há nada no Poema Autoexplicativo.
[7] Mas, e as notas de rodapé? Hein? Hein? As notas de rodapé são a chave, como diriam os teóricos, de compreensão: eu adoro notas de rodapé! Sério. Graças ao Millôr Fernandes: ele reinventou as notas de rodapé, antes tão burocráticas e sufocantes. Limitativas. Impositivas e despóticas. Considero as notas a melhor oportunidade de estabelecer um diálogo realmente produtivo com o leitor.
[8] E, do diálogo, nasce o entendimento, pelo menos o meu entendimento do próprio ato de escrever e fazer poemas, que é exatamente o que estou fazendo agora.
[9] O Poema Autoexplicativo, na verdade, não é um poema. É um título (como você já percebeu), sem poema. Um título que, por si só, deveria ser vazio. Mas, note bem, quando um poeta escreve um poema, geralmente, cria o título por último. Feito um filho que só recebe o nome, que o seguirá por toda vida, após ser concebido, ou, o que é mais raro nos dias atuais, após nascer. Criei o título primeiro.
[10] O vazio, entre o título e o nome do autor, este, sim, é o poema.
[11] O poeta.