segunda-feira, 9 de março de 2020

O luto e a dracaena sanderiana



A dracena sanderiana, ou bambu da sorte, como é mais conhecida é uma planta ornamental de fácil cultivo e plantio. Uma planta de caule com três ou mais nós gera uma outra planta e, assim, sucessivamente. Vida gerando vida.

Ela costuma ser usada para decorar ambientes de luminosidade suave e também é um presente com o qual se deseja boa sorte às pessoas.

Até o final do ano passado (2019) eu não conseguia transpor o luto da morte de minha mãe. Eu não conseguia vê-la afastada do sofrimento que precedeu sua partida, embora meus entes próximos não deixassem de me apoiar e estarem sempre à disposição nos momentos de desespero e dor.

Como muitos sabem, minha filha acaba de completar sua graduação em psicologia. Ela e minha esposa abriram o caminho para que eu encontrasse na psicologia terapêutica os caminhos de fortalecimento e compreensão de meu lugar na vida e de minha percepção de mundo. Um caminho que ainda está no início, mas que já me mostrou diversos horizontes.

O poema que segue é um agradecimento: à vida, que me fez fruto daquela a quem chamei de mãe, Maria Helena; à esposa, Leila, que se fez e me fez matriz de vida, na vida de minha filha, Laura; e ao condutor destas descobertas e reflexões, do qual recebi uma dracena, Felipe Gallonetti.


Dracaena Sanderiana


“I know I was born and I know that I’ll die. The in betwen is mine”
(Eddie Vedder, in "I am Mine")

Cortada do caule, outra muda inicia
a trilha da vida, que Vida lhe deu.
E, agora, respira por seu próprio esforço,
sonhando raízes que, em breve, terá
no solo do tempo, banhada de luz.

A muda era o extremo da forte raiz:
o caule; uma folha; era a própria matriz.
A vida entranhada... sem vaso e sem chão.

Assim somos nós, feito a frágil dracena:
um corte no caule; outra vida que surge!
E aquilo que somos já nasce conosco,
a parte de um todo, maior do que tudo,
tirados daquela que um dia foi muda,
cresceu, ficou forte do caule às raízes...

Mas, mesmo as dracenas, são seres finitos:
Definham, sucumbem ao tempo e ao cansaço.
Conforta pensar que, ao gerar outra muda,
a frágil dracena se torna imortal...

E ser imortal, de raiz em raiz,
é feito correr pela estrada do tempo,
e à frente encontrar um jardim luminoso,
sem grades, sem portas, sem tempo e sem fim.

E cada dracena que um dia existiu
terá reservado, no imenso jardim,
um vaso, um espaço, um abraço e um chão
vivendo no sempre, com quem a gerou.

Sérgio Ferreira da Silva
(Para Helena, Leila e Felipe, em 8 e 9 de dezembro de 2019)