quarta-feira, 7 de setembro de 2011

Nina Rosa Magnani - Do pão mineiro



Este blog é uma fonte de encontros, desde os interiores até os interpessoais. Da postagem sobre Cássio Magnani, além da descoberta de um poeta e trovador completo, com trânsito livre entre o lírico, filosófico e humorístico, há, ainda, a confirmação do ditado "filho de peixe, peixinho
é!".

Nina Rosa Magnani é psicóloga por formação e poeta de nascença. Imagino que sua infância foi coroada de poemas e de contatos com pessoas ligadas ao fazer literário. Ou seja, uma formação cultural como há muito não se vê.

Fui honrado, por ela e seu irmão Cássio, com alguns livros da lavra de seu pai e com o livro que dá título a essa postagem: Do pão mineiro, obra integrante da coleção Poesia Orbital, editada pela Associação Cultural Pandora, de Belo Horizonte, em 1997. Coleção que abriga, além da obra em questão, 61 outros títulos.


Sobre a obra, a autora revela na orelha da capa: "É um olhar feminino sobre sons, cheiros e sabores variados, no grande cuité do coração", o que podemos confirmar, na leitura do poema a seguir...

F R U T A M A D U R A

Tomar a vida nas mãos dói um pouco...
Exige um coração cada dia maior
uma prontidão clara
e simples
cada dia mais simples,
uma fidelidade
inacabada
ao que não se pode pegar
nem tocar
nem reter,
por mais amorosas que sejam
as mãos
por mais lindos os versos
e a dança.

Continuar
exige leveza,
um remanejar dos móveis
e um coração cada dia maior,
ampla e vasta planície,
longo reacender de um mesmo cigarro de palha,
novas velas na cozinha
novo incenso no ar...

Lua nova,
lua crescente,
lua cheia,
lua minguante
e o corpo maré
maré
enroscando uma nova espiral.

E as palavras são milhas
e as combinações
várias
várias extensões
de um mesmo canto
no peito do universo...


O livro reúne reflexões poéticas sobre a vida, as sensações, a passagem do tempo, as perdas e conquistas de todos nós, como nos versos seguintes...


"Tudo está velho
tudo mofou;
as pessoas se mudaram
o amor perdeu a força
a amizade precisa reciclagem.

O baú das mágicas
está cheio de truques
falidos
pólvora molhada
efeitos déjà vu.

O sentido se perdeu
poucos sons tocam
a corda do infinito
adormecida."

A sensibilidade observadora de Nina Rosa Magnani transparece nas linhas e entrelinhas do texto e é simplesmente magistral nos versos do poema que dá nome ao livro. Fiquem com ele, saboreiem e sintam o aroma do pão, que é vida em sua marcha constante...

D O P Ã O M I N E I R O

Deixar fermentar
as idéias
e a vida
ao sol
como essa montanha ao meu lado
(quase posso tocá-la com o dedo)
Antiquissimamente...

Deixar-se embrenhar
emprenhar-se
dessas montanhas de minas
antigas

Ser revolvida
inchada
milenarmente...
Nada sempre existiu de instantâneo...
Trabalhar com as mãos
os instantes
e a eternidade.

Aguardar ao sol
que qualquer dia
arrebente
em trigo
e marcha.